Após alertar sobre o modo aventureiro que alguns corredores de aventura encaram os treinos, venho agora propor sugestões práticas no modo de pensar e agir sobre a preparação física e técnica para as provas de aventura. Para isso, compartilharei algumas percepções e conhecimentos adquiridos como treinador e atleta de aventura nesses últimos 8 anos.
Início de ano é o momento onde a maioria começa a pensar nas próximas provas e desafios. Portanto, acho oportuno apresentar-lhes a primeira parte de um treinamento ideal: O PLANEJAMENTO.
A fase de planejamento é o momento em que reunimos o máximo de informações possíveis sobre as provas que pretendemos participar, definimos metas e principalmente, planejamos o caminho para se alcançar estes objetivos.
Sendo o mais didático possível, dividirei o Planejamento em 5 conteúdos básicos que devem fazer parte desta fase pré-treinos:
1. Modalidade
2. Distância/tempo
3. Terreno
4. Datas
5. Auto-avaliação
1. Modalidade
Qual esporte vamos praticar? Corrida de Aventura (CA)? Então teremos que vislumbrar nos treinos no mínimo 3 modalidades: Corrida, Canoagem e Mountain Bike, além da parte técnica/prática de Navegação e às vezes algumas técnicas verticais.
Definido o esporte e suas modalidades, devemos pensar em algumas particularidades inerentes ao esporte. Nas CA temos, por exemplo, situações constantes de troca de modalidade (transição), canoagem com diferentes embarcações e rios, mochila nas costas, navegação com Mapa e Bússola e outros detalhes que devemos considerar nos treinos.
2. Distâncias e/ou Previsão de tempo
Vou falar aqui em distâncias, mas devemos observar também a previsão de tempo em cada modalidade, pois 30km de MTB no asfalto e no plano pode durar 1hora ou menos, mas com subidas, trilhas e navegação podem chegar a 2h ou mais...devendo, portanto, estar previsto no volume do treino.
Nas CA não há padrão fixo nas distâncias em cada modalidade, o que torna um pouco mais trabalhoso preparar um treino específico. Porém, é possível observar certo “padrão médio” de distância em cada modalidade, tanto nas provas curtas, como nas médias e longas.
Este ponto levanta uma questão importante para refletir: O treino vai ser específico para provas curtas, médias, longas ou mistas? Ter foco em um formato aumentará as chances de sucesso no formato escolhido.
Treinar para provas longas é muito diferente de treinar para provas curtas, e com a evolução do esporte a tendência natural é termos equipes cada vez mais especializadas ou tendo que se especializar em cada formato, onde deveremos escolher se queremos ser mais resistentes ou velozes.
Como temos nas CA a navegação, o fator físico não é necessariamente o decisivo, pois vemos por vezes equipes menos preparadas fisicamente ganhando de equipes mais fortes apenas pela navegação, entretanto, isso não deve servir de parâmetro para treinar mais navegação que o físico, ambas devem acontecer concomitantemente, aprendendo a navegar mais rápido a medida que se melhora a parte física.
Enfim, o ideal seria escolher um formato entre curtas, médias ou longas, ver a média de distância em cada uma delas e preparar o volume de treino sobre este dado. Como a cada prova pode-se aumentar ou diminuir o volume de cada modalidade, faça estes ajustes também nas planilhas de treino visando o máximo de proximidade com a prova.
E para os que fazem tudo que aparece de prova por que é legal ( e é mesmo..”risos”) fica a dica de focar a prova com maior volume e treinar para ela, utilizando as menores como preparação. Mas cuidado, treinar altos volumes por muito tempo pode levar ao chamado “overtrainning”. Neste período há uma diminuição visível da performance, podendo até ocorrer lesões por sobrecarga de treino.
3. Terreno
Subidas, descidas, plano, trilhas, areia fofa, asfalto, estradão...enfim, tudo influencia no ritmo e nas valências físicas exigidas. Provas com muitas subidas, dunas e areia fofa vão exigir mais força, e provas em terrenos mais planos e estradões facilitarão um ritmo de corrida mais veloz.
Portanto, identifique a altimetria e tipo de terreno que provavelmente vão passar e tente reproduzi-los nos treinos.
Como foi dito, o terreno influência muito a previsão de tempo em cada modalidade; portanto, este é um fator importantíssimo na montagem do planejamento. Na dúvida, utilize a previsão de tempo como referência, a fim de que o organismo se adapte para suportar o período de exercício previsto na prova. Assim, criar-se-á as reservas energéticas necessárias para manter um ritmo constante até o fim.
4. Datas
Obviamente que as datas são importantes, mas não apenas para saber quando devemos comprar as passagens. Definir as datas com antecedência vai permitir que possamos se preparar de forma gradual e segura para cada desafio.
Pelas datas podemos organizar e definir a ou as valências físicas prioritárias e período no treinamento que vamos desenvolvê-las.
Fazer uma tabela no Excel com as semanas de treino até cada prova alvo é um exercício que permite visualizar melhor o ano como um todo e ajuda a perceber que o tempo para se trabalhar cada valência física sempre é menor do que se imaginava. Portanto, antecipar-se ao máximo é um ponto diferencial no planejamento, aumentando as chances de sucesso e prevenindo muitas lesões devido a treinos de última hora feitos de forma aleatória.
5. Auto-avaliação
Nesta fase devemos fazer uma auto-avaliação sobre a performance no ano anterior para servir também como referência nos pontos a serem melhorados para este novo período.
Se faltou força nas subidas ou nunca conseguiu fazê-las correndo, se caiu nas trilhas mais técnicas de bike, se errou muita navegação, se não conseguia manter o duck reto no rio ou se sempre virava nas corredeiras nível 2 (risos), se faltou comida, se faltou acordar mais cedo para preparar melhor a mochila antes da prova, enfim, tudo que faltou para um desempenho de excelência.
A dica é que a cada final de prova a equipe faça um rápido levantamento das dificuldades, falhas e acertos, buscando sempre aprimorar já para a próxima etapa. Anotem tudo e criem um arquivo que servirá para percepção da evolução da equipe ao longo do tempo.
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Enfim, basicamente é isso, não tem mistério, é questão de organização e antecipação das dificuldades a serem enfrentadas. Neste roteiro apresentado cada um pode complementar com o que achar conveniente, pois quanto mais informações estiverem presentes nesta fase, maiores serão as chances de sucesso.
Todo Planejamento a longo prazo pode e deve estar sensível a mudanças de contexto....mudar o planejamento muitas vezes é necessário, o que não pode existir é o não planejamento. Lembrando uma conhecida frase que diz: “ Quem não planeja, planeja seu fracasso.”
Estas dicas servem tanto para amadores que desejam participar das corridas de aventura por lazer e diversão, como para atletas de ponta que almejam colocações ao pódio. A questão aqui não é simplesmente de performance, mas de um treino seguro e que traga benefícios e não lesões e frustrações.
Aproveito para incentivar aos atletas de aventura a buscar um treinador formado em Educação Física para organizar e planejar o seu treino. É o profissional competente para esta tarefa e certamente um investimento que valerá a pena!
Espero ter ajudado e me disponho a responder quaisquer dúvidas, queixas ou elogios...
Bons treinos!
Márcio de Avila Palermo
Formado em Educação Física pela UFRGS
Especialista em Treinamento Desportivo pela UGF
Proprietário da Running Sports – Assessoria Esportiva
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