Após 2 anos sem colocar os pés no mundo das Corridas de Aventura, recebi o convite do Helio Jugurta (Equipe Makaíra) para participar da Copa América de Corrida de Aventura. Seriam aproximadamente 200km de prova na região de Costa Rica, Mato Grosso do Sul. Honestamente eu não estava nem um pouco preparado para este desafio, mas não havia a menor possibilidade de perder a chance de voltar a este mundo maluco e maravilhoso, ainda mais em uma prova como esta.
Pois bem, voei de Curitiba para Campo Grande e de lá tudo já estava organizado pela CBCA para irmos de ônibus até Costa Rica, cidade base da prova. Organização muito boa, transporte confortável e um empenho gigante dos responsáveis para que ficássemos bem instalados antes da largada. Uma sensação muito boa em rever diversos amigos e conhecidos deste mundo e o mais maluco é que mesmo sem correr à um bom tempo, a maioria das pessoas que estavam por lá eram conhecidas (isso me faz pensar que precisamos introduzir mais pessoas novas neste esporte para que ele volte à crescer, mas isso é papo para um outro texto).
Tudo organizado, participamos do projeto social que era plantar uma árvore na cidade de Costa Rica e deixar nossa marca na manutenção da natureza. Achei a iniciativa bem bacana e confesso que curti bastante participar deste projeto. Até aqui tudo ia muito bem e geralmente nas corridas de aventura, quando as coisas estão muito calmas é porque algo está errado.
Briefing com jantar à noite e eis que surgem Fran e Lucas, grandes amigos e mitos das provas de aventura. Não sei se eu ficava feliz em revê-los ou preocupado em saber que eles é quem tinham traçado todo o percurso. Eu, como muitos fãs das antigas e extintas Chauás, sei que quando se trata desta dupla no traçado do percurso pode-se preparar para o pior dos perrengues (e era exatamente isso que estava por vir).
Últimas palavras do Fran no briefing: Final da Copa América, podem esperar uma prova mais curta que a do mundial, porém tão difícil quanto. Ferrou!
Bom, chega de preparação, hora de falar da corrida e socar a bota!
Sexta-feira, 10:00am todos reunidos para uma largada com corrida pela cidade. Pela avenida principal de Costa Rica, passávamos em bando e éramos aplaudidos por toda a cidade que nos recepcionava com muito calor e alegria. Animação top, praticamente 3 km de corrida e chegamos às bikes.
Pela frente teriamos aproximadamente 40km de bike até o PC 4 (como não naveguei desta vez, me desculpem se as distâncias estiverem um pouco erradas), saímos em comboio pelas plantações da região e mesmo com uma baixa altimetria, pegamos um pedal de terra fina e altamente desafiador aos músculos. As bikes escorregavam para todos os lados, ultrapassagens eram difíceis de realizar e tínhamos que nos concentrar para não perder o grip do pneu e "tomar um rola" no meio dos pequenos pelotões.
Navegação acertadíssima, vencemos as falsas retas e batemos no PC/AT 4. Hora de colocar nosso trekking à prova na parte que já sabíamos que seria a mais difícil da corrida. Com aproximadamente 18 km de trekking total (PC 4 ao PC 7) faríamos um loop por canions da região, seguindo por trechos sem nenhuma trilha e que prometiam ser o ápice em beleza natural.
Navegação ainda redonda, pegamos o PC5 (ainda com trilhas) e partimos para a descida do morro que agora já seria por nossa própria conta e sem a ajuda de nenhuma trilha marcada. Encontramos rapidamente a descida por uma canaleta de água de chuva que nos ajudava a transpor este obstáculo (acredito que fomos a terceira ou quarta equipe a descer o Canyon) e chegamos na parte inferior, onde a prova realmente começou.
Equipamento obrigatório para todas as equipes, o facão de mato começou a trabalhar juntamente com Saulo, nosso atleta com muita experiência de matagal e organizador da Casco de Peba em Petrolina. Com seus 1,92m de altura, Saulo abria pequenas avenidas para que conseguíssemos passar e assim seguimos alternando entre um rio e rasga mato durante umas 5 horas. Fizemos a primeira curva do loop inferior e usamos uma cerca como referência para "cortar" a borda do morro (acreditamos que seguir pela antiga cerca talvez fizesse com que pegássemos uma altimetria não tão forte) e conseguimos atingir o outro lado da montanha.
Pela nossa referência, o desafio agora seria seguir no sentido contrário do rio principal, encontrar o segundo afluente e azimutar para o PC6. A evolução estava muito baixa, porém tudo ainda corria dentro do planejado. Como disse anteriormente, em corrida de aventura quando tudo vai bem é porque algo está errado.
Ficamos das 13:00 de sexta às 8:40 de sábado para conseguir sair daquele trecho. Encontramos diversos outros rios que pareciam ser os afluentes, mas nada fazia sentido. Eu e a Amanda fomos picados pela tal formiga Tucandeira, que causa febre e muita dor (tomamos o anti-histamínico na mesma hora para prevenir e seguimos bem, só com a dor).
Todos da equipe tiveram um pequeno principio de hipotermia por volta das 3:30am e optamos por subir um dos morros e fazer uma fogueira para nos esquentar e vencer a noite. Dormimos por 1 hora talvez e mesmo com todos estes perrengues, acordamos às 6:00 com o nascer do Sol e um visual de tirar o fôlego. Com o clarear do dia tivemos também o clarear das ideias e a navegação voltou à fazer sentido. Entendemos onde estávamos e percebemos que tínhamos passado MUITO perto do PC6 na noite anterior. Não lembrava o quão difícil era navegar a noite e desta vez Lucas e Fran se superaram! Talvez um dos trekking mais sinistros que ja presenciei.
Enfim, PC 6 recolhido, tínhamos certeza de que estávamos em último na prova inteira e para nossa surpresa tínhamos sido a 9ª equipe a bater no PC. Caramba, praticamente todas as equipes tinham "batido cabeça" e dormido ao relento como nós!!!! Batemos no PC junto com a equipe Brou Aventuras (e só isso ja era motivo de comemoração, pois os caras são sinistros!).
Seguimos para as bike no PC/AT 7 às 9:00am com um calor de mais de 30º C e no caminho nos deparamos de longe com uma grupo de porcos "queixada". Fiquei sabendo pelo Saulo que este animal é um dos mais perigosos da mata, pois anda em bando e atropela tudo que cruza seu caminho. Não tinha a menor ideia deste perigo e quando ouvimos o barulho, seguimos a instrução do Saulo e corremos para as árvores. Segundo ele, para fugir do queixada deve-se subir em uma árvore e esperar o bando passar. Não foi preciso subir, pois eles não nos viram mas confesso que o susto foi grande.
Estávamos detonados do trekking, mas pegamos as bike e partimos para os próximos PCs na certeza de que estávamos bem na prova ainda e tínhamos chance de recuperar. Com nosso pequeno pelotão de 4 pessoas formado, voamos em direção ao PC 8 com ritmo de treino de tiro e foi neste ponto que a prova nos pregou outra surpresa. Rasga mato com bike, passamos umas 4 horas seguidas debaixo de um Sol infernal tentando achar a entrada e saída deste bike/trekking. Muitos espinhos no corpo, carrapatos aos montes e rasgos na mão. Ali foi o ponto em que a prova se mostrou um desafio acima do que estávamos preparados. Não conseguimos transpor este obstáculo e após muita, mas muita tentativa mesmo, optamos juntamente com outras equipes a abandonar a prova e retornar pedalando por uns 45km até Costa Rica.
Sensação de tristeza em abandonar uma prova como esta, só amenizada ao saber que muitas equipes referência também abandonaram como nós. Mesmo com esta sensação, fiquei muito feliz em ter retornado a este esporte em uma prova maravilhosa como esta e principalmente, com uma equipe tão forte quanto esta formação da Makaíra.
Parabéns e minha admiração às equipes que conseguiram passar do PC6, do PC8 e sabe-se lá o que foram os PCs posteriores. Vocês são fera!!!
Corrida de aventura é assim, às vezes estamos num bom dia, às vezes não conseguimos atingir nosso objetivo final. Lógico que gostaríamos de ter terminado a prova completa, mas honestamente não fomos la só pelo término, mas sim pela experiência de vivenciar todas estas emoções ao lado de pessoas bacanas e isso para mim foi o que mais valeu.
Saí desta final de Copa América com vontade de treinar mais forte, de voltar a exercitar a navegação e com a certeza de que eu pertenço a este mundo de malucos. Hoje, 1 dias após o perrengue total, tenho a sensação plena de que consegui atingir um dos objetivos que fui buscar: A sensação de que estou muito vivo!
Ah, e é lógico que nossa formação da Makaíra ja está se organizando para a próxima prova. Com um integrante de cada estado, já estamos planejando nos juntar em breve para correr a Expedição Gralha Azul no Paraná com seus 150kms. O que!? Mal terminaram esta prova e ja querem sofrer de novo?? Pois é, afinal, não é isso que nos move à continuar em frente? Não sei vocês mas eu reencontrei a motivação que estava buscando há 2 anos!
Equipe Makaíra – formação original da Bahia
Helio Jugurta (Capitão) – Maceió (AL)
Saulo Rosa – Petrolina (PE)
Amanda Lopes – Belo Horizonte (MG)
Maurício Cervenka – Curitiba (PR)