Quando me vi dentro de casa, sem poder sair, indo da cama para sala e da sala para cama, vendo meus tênis de corrida parados, minhas bikes pegando pó e meus squeezes criando fungo, percebi que algo estava bem errado e que talvez tivesse que seguir uma nova realidade. Apesar disso, não estava doente e me sentia muito bem fisicamente.
Treino em Atibaia – Foto: Sergio Braz
O início de tudo isso aconteceu na madrugada entre 31 de Setembro e 01 de Outubro de 2012. Um acidente, totalmente inocente e sem sentido, me fez perder uma das minhas principais ferramenta de trabalho, a visão do meu olho esquerdo.
Formado em Designer Gráfico, fotógrafo profissional e videomaker, tinha nos meus olhos tudo que precisava para exercer as minhas profissões da melhor forma. Amante de esportes, Surf, Judô, Futebol, Corrida, Skate, SUP Surf, Skimboard, Corrida de Aventura e tantos outros, adorava praticar o máximo que pudesse de todos eles.
Meses após o acidente – foto: arquivo pessoal
E naquela madrugada, quando tudo escureceu rapidamente, como uma mágica, me vi longe de tudo isso, da profissão e dos meus hobbys, sem saber se um dia voltaria ou conseguiria realizar tudo novamente.
Até hoje foram 6 intervenções cirúrgicas, totalizando aproximadamente 12 meses parado (dentro de casa) em um período de 3 anos e 4 meses.
Quando você tem um olho só, muita coisa muda. Sua percepção de espaço ao seu redor diminui, a profundidade e distâncias das coisas passam a ser indefinidas, seus ouvidos se desenvolvem e você literalmente passa ver o mundo em duas dimensões até que seu cérebro se adapte. E todas essas mudanças me tiraram dos esportes que amava, não podia mais fazer nada que tivesse contato direto, como lutas e futebol, os buracos e pedras pareciam ter tamanhos e distâncias diferentes do que realmente eles tinham e a água do mar fazia mal para o olho ainda traumatizado e que sobrevivia a base de muitos colírios.
Haka Race Poços de Caldas antes do acidente
Essas dificuldades me afastaram dos esportes por pouco mais de 2 anos. Engordei quase 20kg e perdi todo meu preparo físico. Porém, no dia que me percebi literalmente na pior fase da minha vida (fisicamente), tomei um soco e acordei. Tava na hora de mudar.
Naquele momento, a 1 ano e meio atrás, tracei uma meta, um objetivo: voltar à forma física, treinar, emagrecer, me adaptar às dificuldades do acidente e dos colírios, de ter um só olho, superar os medos e receios. E completar a prova El Cruce de Los Andes em 2016 (100km pelas Cordilheiras dos Andes), uma prova que exige técnica e preparo.
Treino no Pico dos Marins – foto: arquivo pessoal
Sabia que não seria fácil e que no meio do caminho ainda passaria por mais uma intervenção cirúrgica que me deixaria pelo menos mais 4 meses parado. Busquei exercícios funcionais para melhorar meu equilíbrio, percepção visual e força; uma nutricionista para mudar minha dieta e transformar meu corpo; e uma assessoria de corrida especializada em esportes outdoor e aventura para programar meus treinos e me deixar na melhor forma física.
No meio do caminho, algumas mudanças me levaram a não ir mais sozinho para a prova como estava programado e a partir daquele momento, passaria a correr como dupla mista, com minha namorada, também amantes dos esportes e Corredora de Aventura, Margarete Oti.
Foram muitos treinos durante todo o período, que se intensificaram principalmente nos meses de novembro, dezembro (2015) e janeiro (2016). Entre alguns deles, uma prova de Corrida de Aventura (com um 2º lugar), uma etapa do Circuito das Serras 21km (com um 6º lugar geral), o trekking na Serra da Amolar durante o Mundial de Corrida de Aventura (onde conciliei trabalho e treino), um fim de ano 2015/2016 de muitas trilhas em São Sebastião e Ilhabela (e poucas festas), e muitos "bate-volta" até a antena na Serra do Japi.
Trekking na Serra do Amolar (Pantanal) durante o Mundial de Corrida de Aventura 2015 – Foto: arquivo pessoal
Cada pecinha dessa história teve sua importância para eu montar, ou melhor, remontar esse quebra-cabeça, que estava bagunçado, com algumas peças perdidas e a maioria delas espalhadas.
Hoje, 08/02/2016, posso dizer que me encontro na melhor forma possível, totalmente adaptado as minhas dificuldades e com a certeza que cumprirei meu objetivo traçado a 1 ano e meio atrás. Sei que a minha vitória pessoal eu já conquistei e cheguei em 1ª lugar, o que vem pela frente nos próximos dias será somente a complementação e o momento para registrar que realmente voltei a ser quem eu era, e a colocar definitivamente a última peça nesse quebra-cabeça.
Circuito das Serras – Foto: Alexandre Janotti
E lá no Cruce, além de corrermos, vamos registrar os principais momentos dessa prova, do lugar fantástico por onde ela passa, os acampamentos, vamos tentar passar através da imagem todas as dores, dificuldades e alegrias dos atletas…voltaremos com uma bagagem a mais, de muitas fotos, histórias, recordações e dicas…tudo para compartilhar e ajudar outras pessoas à realizar esse grande desafio!
Então vem com a gente!
Murilo Mattos e Margarete Oti
El Cruce de Los Andes 2016
Equipe: MMs AKSA
Número: 1421
Foto: Sergio Braz
Para conhecer seu trabalho profissional: www.murilomattos.com.br