Eu e o Paulo Bruning nos conhecemos a pouco tempo. Sempre competimos em equipes diferentes nas corridas de aventura pelo Brasil afora e mesmo com o pouco contato que tivemos já diria que tínhamos uma amizade.
Certo dia resolvi mandar uma mensagem particular para ele e manifestar meu desejo de que fizéssemos uma prova juntos. Não bastou mais que poucas palavras para que surgisse a ideia de corrermos juntos pela minha equipe Alto Uruguai Expedition Team, e que depois eu retribuísse correndo com ele pela Guartelá, sua equipe do Paraná.
Paulo havia corrido a Chauás 180K há poucos dias e mesmo assim disse que teria interesse em correr a famosa Papacorrida, prova organizada pelo Instituto Papaventuras, do renomado Atleta Valmir Schneider e sua família. Não havia oportunidade melhor.
A Papacorrida é diferenciada, uma prova de integração de amigos e atletas, com uma hospitalidade familiar mas com atributos das provas mais difíceis do Brasil e com certeza a mais difícil do sul do Brasil.
Valmir é um atleta e incentivador do esporte nato, mas como bom orientador nunca gostou de facilidade, consegue utilizar o terreno magnífico que Venâncio Aires possui, tornando a cada ano a sua prova mais técnica, com navegação apuradíssima, e com morros, subidas, trilhas e descidas incontáveis e intermináveis.
Nesse ano foram 100 quilômetros com altimetria acumulada de 4.000, com previsão de 15 horas para sua realização na totalidade. Bom, não passamos muito longe disso.
A largada da categoria expedição foi às 21 horas de sábado. Adrenalina a mil, nervos a flor da pele, pois a promessa era de uma prova duríssima, e não foi diferente.
Lembro bem das palavras do Paulo antes da largada: “Vai ser cansativo, vai doer, vai dar sono, vai dar fome, vai dar sede, mas vamos seguir, e vamos cruzar a linha de chegada!”
Essas palavras não me saem da memória, e como eu esperava, o Paulo foi perfeito. Sua serenidade é ímpar, sua técnica de navegação impecável, estratégias perfeitas e uma parceria e amizade absurda.
Começamos a prova com um trekking com várias opções, posteriormente primeira “perna” de pedal com mais de 40 quilômetros madrugada a dentro, presenteados por uma lua linda que iluminava naturalmente o percurso, temperatura amena que fez com que casacos corta vento e qualquer outro item fosse apenas um peso a mais na mochila.
Ao descermos a primeira montanha vimos a trilha ser tomada por uma forte névoa que impedia a visão de avançar mais que 2 metros além da bike, mas com todo cuidado seguimos, entre grandes descidas, fortes subidas e diversas picadas de formigas e abelhas.
Ao chegarmos na segunda área de transição, fomos recebidos com imenso carinho e um maravilhoso “PL” ( pão com salsichão), nessas horas, uma comida de sal, quente, é algo ímpar. Seguimos a prova, firmes e confiantes do trabalho que estávamos executando.
Lá pelas 5 da manha, estávamos próximos ao ponto 8 na carta, quando encontramos a equipe da Krakatoa, composto por Leandro Bitencourt (Xexa), Carlos Eduardo Kroth (Dudu), Carol Schimidt e Gabriel Kretschmer.
Seguimos toda a prova alternando nossas posições, hora estavamos a frente, hora estavamos atrás. Mas cabe ressaltar que é exatamente nesses momentos que a corrida de aventura evidencia uma das suas características mais belas e importantes, a parceria e amizade.
Toda corrida tem sua competitividade, porém quando se enfrentam desafios como os propostos pela familia papaventuras, a união realmente demonstra sua força e todos se unem com o objetivo de cruzarem a linha de chegada com pleno êxito, independente da colocação.
Passaram-se muitas horas, muitos quilômetros. O cansaço aumentava e por consequência o desânimo batia, porém seguiamos fortes, vez ou outra saia uma piada sobre o percurso, ou menções "carinhosas" ao Valmir e a Rose pela escolha a dedo dos locais para alocarem os prismas e picotes.
Paulo e eu fizemos uma excelente prova, fomos companheiros e amigos acima de tudo, nos divertimos, várias risadas, piadas sobre o nível da prova, sobre as subidas intermináveis, sobre o cansaço, sobre as dores musculares. Passamos metade da prova brincando que daríamos um sprint na chegada, e não é que foi assim?!
Depois de aproximadamente 19 horas, 100 kms tivemos nosso momento de loucura, soltamos os freios da bicicleta e chegamos ao fim da prova com um sprint digno das melhores corridas vistas na televisão. Lá pelas 14 horas de domingo, nos aproximamos da linha de chegada.
Nesse momento, dores são esquecidas, picadas de abelha já não doem como antes, e o sorriso volta ao rosto. Melhor que cruzar a linha de chegada é saber que o segundo lugar mais alto no pódio é seu, que haviamos realizado o segundo melhor tempo de prova, que a equipe Krakatoa havia conquistado o 1º lugar nos quartetos e que no total apenas 4 equipes haviam concluído a prova sem sofrer cortes, ou seja, completando a prova na sua totalidade nos mais de 100 quilômetros, são elas, nós da Alto Uruguai Expedition Team, Essa é nossa vida, dos atletas Jonas e Leo de Paula, que obtiveram a 1ª coloção nas duplas e o melhor tempo geral, e a equipe Vento Norte, do experiente José Carlos Pascotini e Glaucio Venturini.
Final de prova é diversão, curtição, poses para as maravilhosas fotos de Wladimir Togumi, confraternização e muitas histórias entre os amigos e companheiros, afinal, nesse momento não existem adversários.
Seja na categoria expedição ou aventura todos saem como vencedores, todos saem como heróis por terem superado os desafios impostos pela prova, por superarem a si mesmo e por descobrirem que a corrida de aventura por si só passa longe de ser apenas dor e sofrimento, ou ser apenas um esporte, corrida de aventura é desafiar a si, é quebrar limites, é mostrar que o ser humano quando determinado e com próposito em mente super qualquer barreira.
Gostaria de agradecer a minha querida namorada Fernanda Runtzel pelo apoio e parceria, a esposa do atleta Leandro Bitencourt pelo refrigerante gelado no nosso último "AT", bem como a toda comunidade da Linha Duvidosa, e a família Papaventuras, Valmir, Rose, Larissa e Lavínia por tratar de cada um de nós como parte da família, e aliás, ouso dizer que somos realmente todos uma família, uma família de loucos por aventura.
E não poderia encerrar esse meu simples relato sem uma agradecimento especial a meu companheiro de equipe Paulo, obrigado pelo teu comprometimento com nosso objetivo, obrigado pelo teu empenho, pelo teu carinho e amizade, obrigado pela tua parceria, obrigado por enfrentar uma longa viagem para esta prova. Tenha certeza que esta prova estará guardada não apenas no troféu recém posto na minha estante, mas com certeza no meu coração como uma das melhores provas da qual já participei. Espero que no futuro possamos correr novamente juntos e nos aventurarmos por ai!
Lembrem-se…
É aventura, é Alto Uruguai Expedition Team