Corrida de aventura. Esse é o nome do esporte que acompanho há muito tempo, mas posso contar nos dedos (de uma mão) as vezes que participei de uma corrida.
Não tenho certeza de como surgiu a ideia do Rafael Campos me chamar para fazer formar uma dupla. Lembro apenas de um comentário no Facebook e quando o encontrei na etapa em Nazaré Paulista, o convite/intimação foi feito pessoalmente. A prova escolhida foi o Haka Race Contra-Relógio 3 em Juquitiba dali um mês.
Para quem não conhece, Rafael Campos é capitão da equipe QuasarLontra, equipe vencedora de diversas provas e participação nas maiores corridas de aventura do Brasil e do mundo. E isso criou uma grande expectativa em muita gente (e mim inclusive, é claro).
Mas a verdade é que esse relato será uma decepção para aqueles que esperavam que Rafael imprimisse um ritmo alucinante e eu tivesse que acompanha-lo (e tenho certeza que essa era sua ideia inicial), mas como dizem por aí “a velocidade da equipe é igual a velocidade do integrante mais lento” e obviamente eu era essa pessoa.
Fiz uma postagem nas redes sociais dizendo que para mim seria um desafio físico de completar os 40 quilômetros no menor tempo possível e para o Rafael, um desafio psicológico de fazer os 40 quilômetros no maior tempo possível. Hoje escreveria a legenda de forma diferente, pois agora imagino que o tempo longo não tenha sido o maior empecilho, mas sim, o ritmo lento de prova. Buscar adversários e tentar recuperar o tempo perdido daria uma dinâmica diferente.
Sem fazer nenhuma atividade desde o começo da pandemia, o quanto antes enviei uma mensagem para meu irmão Sidney Togumi da UpFiTrail, informando que precisava de uma planilha de treino para uma corrida de aventura de 40 Km dali um mês. Não disse com quem eu iria correr e isso levantou uma incógnita do lado de lá. A resposta irônica (mas com ponta de verdade) veio rápido: “não fazemos milagres”. Mas a planilha chegou.
E alguns dias depois, Rafael publicou o vídeo-convite. O segredo já não era mais segredo.
Treinar nunca foi meu forte, mas desta vez saí para correr nas avenidas próximas de casa à noite, mesmo sob chuva, pensando em dar o mínimo de trabalho na prova. Eu (acredito) que sabia onde estava me metendo, mas será que o Rafael sabia?
Foram 3 semanas de corrida 2x por semana, com uma saída para treino mais longo em trilha em Extrema; em relação ao MTB, em um final de semana fugi da planilha que pedia corrida e fui pedalar uma vez na terra; em relação à canoagem… o que é canoagem?
No fundo sabia que os treinos não seriam o suficiente, mas em uma “conta de padaria” de distâncias média de cada modalidade, acreditava que poderia completar os 40 quilômetros.
Lembro de 2 ou 3 ocasiões em que Rafael me perguntou: “Está treinando?” A resposta sempre foi “Sim”. Não era mentira, mas não estava treinando tudo o que deveria. A chegada da pandemia, ao contrário do que alguns possam imaginar, restringiu meus horários por ter que abraçar atividades em horário comercial.
Além disso, duas semanas antes mandei uma mensagem para o Rafael: “Consegue uma bike emprestada?”. Fiquei o imaginando lendo a mensagem e pensando “mas ele disse que está treinando e não tem bike?”.
Em paralelo mandei também mensagem para um conhecido na Specialized que fez uma correria e conseguiu uma bike na semana da prova. (obrigado Catalan!).
Equipamentos separados, alguns acessórios não-essenciais faltando mas que não mudaria muita coisa, bastava agora pensar em roupas e alimentação, que depois de muitos “levo-ou-não-levo”, ficaram no mínimo básico.
A prova
O grande dia chegou e tive a sensação de Déjà-Vu ao ver a previsão de chuva e frio para 31 de outubro, dia agendado para fazer o Haka Contra-Relógio. Num longínquo sábado, ali mesmo no Sitio Canoar em Juquitiba, participei de uma etapa do pioneiro Circuito Brasileiro de Corrida de Aventura nas mesmas condições previstas e imaginava mais ou menos o que teria pela frente. E naquele momento não foi nada bom.
Mas São Pedro estava mais calmo desta vez. Choveu, fez frio, mas no geral o clima esteva muito bom para fazer a prova. Se estivesse calor a dificuldade seria bem maior.
A falta de treino pesou, é claro. A gente acha que vai dar conta, mas na hora do vamos-ver as pernas travam, falta energia, a cãimbra ameaça aparecer. Às vezes um de cada vez, em outras, tudo junto.
Posso dizer que andei bem…. nos primeiros quilômetros. Depois recebi ajuda na canoagem e nas subidas de mountain bike. Mas o objetivo era seguir em frente, sempre.
Na canoagem com motor de proa eu tentava não parar de remar, por menor volume de água que eu deslocasse, para não dar muito trabalho. Mas não tinha jeito… eram algumas remadas e outras paradas para respirar. No final estava igual o Horácio (quem não conhece, faça uma pesquisa no Google desse personagem da Turma da Monica), com o ‘braço curto’, praticamente encostado no corpo, tentando remar com o braço cansado.
Lembro também do trekking após canoagem onde tinha um cachorro alucinado em um dos sítios com uma cerca que não o deixava sair para a estrada. O cão latia e o Rafael latia de volta. O cão rosnava e ele rosnava de volta. Em um momento ele se vira e me diz algo como: “se o cachorro se soltar você vai ter que correr, porque ele vai pegar quem ficar para trás.” Esse é o verdadeiro trabalho de motivação em prática!
A seção de mountain bike foi um caso à parte. As pernas não respondiam e quando possível, recebia um “empurrãozinho” nas subidas. Mas chegou uma hora que mais nada funcionava e então fiz uma ótima parceria com a bicicleta: ela me levava para passear na descida e eu a levava para passear na subida.
Enquanto seguíamos em direção a um dos postos de controle, encontramos uma dupla parada numa bifurcação. Eles eram da prova curta, tinha perdido o mapa e estavam longe do ponto de onde tinham que retornar para a base da prova. Simplesmente continuaram seguindo em frente sem rumo! Após algumas orientações do Rafael, a dupla retornou.
E no meio do mountain bike, mais uma situação engraçada. Encontramos o organizador Leonardo Barbosa e ele começou a fazer um video. Enquanto isso encostou um senhor, vamos dizer assim meio alcoolizado, e disse que eu parecia uma chinês pernambucano… Pensei comigo: “devo estar mal mesmo”.
É interessante como o ânimo se alterou durante a prova. Lembro do Rafael perguntando: “Já bateu a pergunta ‘o que estou fazendo aqui?’”. Essa pergunta nunca passou pela cabeça. O que eu ficava pensando era “caramba, não consigo ir mais rápido”.
E lembro de ter respondido algumas vezes que poderia ter mudado para os 25 Km. Mas depois de descansar, me alimentar e ter tempo para me recuperar, mudar dos 40Km para os 25 Km teria sido uma das piores decisões. As dores no corpo seriam as mesmas, não faríamos dois trekkings incríveis (com direito a rasga mato) e voltaria frustrado por não ter feito a distância prevista.
O lado que PODERIA ser positivo é que teríamos a motivação de uma disputa com equipes de conhecidos que largaram antes de nós. PODERIA ser positivo, porque provavelmente teria que fazer muito mais força na disputa.
Fechamos com aproximadamente 7h40 de prova. A sensação de finalizar a prova é muito boa, mas ao mesmo tempo fico com uma sensação de dever não-cumprido e uma oportunidade desperdiçada de correr ao lado de um dos melhores corredores de aventura do Brasil e não ter aproveitado para aprender algumas coisas na prática.
Rafael foi muito paciente com meu ritmo. Tão paciente que fico preocupado com seus companheiros de equipe nas próximas provas, porque em algum momento terá que extravasar a paciência acumulada.
Próximos objetivos: aproveitar e manter a motivação para continuar treinando e quem sabe (repetindo: quem sabe… e isso não é promessa, hehehe) no futuro, formar novamente a dupla para outra corrida.
Mas estou ciente que precisarei estar muito bem preparado, pois na próxima vez a estória será outra. Como disse nosso amigo Djalma Dutra na semana da prova: “Toma cuidado, porque galinha que acompanha pato, morre afogado. Se cuida que o chicote vai estalar!”.
Quem quiser se aventurar, visite www.hakarace.com
sensacional seu relato Togumi!! A tempos que eu não lia um relato de prova em que me diverti e me animou. Depois de mais de 20 anos correndo, eu mesmo já não relatava prova, a não ser as expedicionárias com mais de 300km, pois achava que não geravam mais impacto. Mas percebi que não.
Que tantos que dizem “um dia quero correr” se inspirem no seu exemplo e encarem uma corrida de aventura.
Foi muito bacana ter corrido contigo e pode continuar se preparando que outras oportunidades surgirão. Já sei de mais gente querendo fazer dupla contigo e outros fotógrafos e repórteres também me cutucaram querendo a “chance deles”. Mas segue os treinos que em breve correremos outra juntos, e desta vez o “chicote vai estalar”, vamos pra buscar resultado e terminar esgotado.
Parabéns, abs
Haha D+++ Togumi, rachei aqui, curti d+ o relato, bora p a próxima!hehe
Togume já te falei que eu (Euder advogado aventureiro ) sou seu parceiro ideal há há há abraço a todos.
Hahahaha!!!! Togumi, belo relato! Sábado quando te vi fazendo as fotos lembrava deste texto e dava risada! Levar a bike pra passear na subida, quem nunca???? Nos divertimos tanto que rodamos 60km ao invés de 40 e isso nos custou 12h de prova! Mas foi sem dúvida muito divertido! Um grande abraço e quero saber onde encontro/compro as fotos! Até a próxima aventura!!!!
Togumiiii adorei o relato! 🙂 Parabéns pela prova! Quero ver você participando de uma próxima hein? PS: Na foto sua empurrando a bike, você está a CARA DO SIDNEY! HAHAHAHAHA.