O Brasil tem um potencial impar em belezas naturais, fato indiscutível. Mas às vezes elas ficam ocultas em paraísos distantes dos centos urbanos e que somente aventureiros experientes e dispostos conseguem ter acesso. A Serra do Cipó não é este caso! Apenas 100 km da capital mineira lá é um recanto de belezas naturais, serras cortadas por rios e desafios radicais. A Brou Aventuras caprichou na escolha da sua primeira etapa.
Estava no meio de um trekking mais duro e bonito que fiz na minha vida. Uma travessia de um canyon digno de cenas do Eco Challange, que tanto me inspiraram para começar a fazer corrida de aventura. Uma serra de pedra a 1250 m acima do nível do mar, cortado no meio por um rio. O ritmo estava alucinante, já tinha feito o primeiro de trecho de mountain bike junto com a equipe Quasar Lontra e vinha no primeiro pelotão. O ritmo da Quasar era muito forte pra mim e perdi contato logo no inicio do trekking. Não dava para forçar demais, ainda tinha muita prova pela frente.
Não tardou e encostou a dupla Advogados Aventureiros e o quarteto BMS, só monstros. Não acreditava que estava andando ao lado de feras que ganharam o Ecomotion, é apenas meu terceiro ano de corrida de aventura e o segundo disputando na Solo, ou seja, Junior ainda! A travessia do canyon foi animal terminando no alto da montanha. Tínhamos que descer junto a um rio, o crux da prova segundo a organização, e era mesmo. Eu a dupla Advogados Aventureiros estávamos juntos, um vacilo de não conferir o azimute nos jogou numa verdadeira roubada. Descemos uma escarpa da montanha que qualquer vacilo do pé podia nos jogar em uma queda livre de 30m. Não dava para pensar muito, minutos são preciosos quando você está liderando sua categoria. Porém, corrida de aventura, a despeito do físico, é a arte da navegação e pecamos nela.
Caímos na estrada que tínhamos passado na ída e uns 8 km do PC 4 que buscávamos. Não dava para desanimar naquele momento. Veio um nó estômago de saber que liderança tinha sido perdida por um erro. Faz parte. Bati o PC 4 em quarto na categoria, mas o terceiro estava apenas 8 min, porém era nada mais nada menos que Ezio da Trotamundo um mito das corridas de aventura (que tinha quebrado a gancheira de sua bike, trocado e voltado para prova...). Nossa, pensei comigo, vou ter que fazer muita força hoje! Peguei a bike e soquei a bota sem dó, além de ter que buscar os adversários tinha um corte bem apertado no PC 8. No PC6 encostei no Ezio e segui fazendo minha prova. Na área de transição, no centro da cidade, já estava em terceiro, quando vou assinar a planilha sou informado pela organização que o segundo lugar desistiu da prova. O que leva alguém que está em segundo desistir? Ainda mais que é o experiente Thiago Mol. Só podia ser roubada o que teria pela frente!!!
Saí para o trekking com a dupla Tendência Outdoor (Freddy e André). Um trekking plano e tranquilo. Encostamos no quarteto Papaventuras (Valmir, Rose, Pedro Pinheiro e Bicudão) e seguimos juntos. Terminamos o trekking e tínhamos uma bike curta até o remo. O remo era por um rio tortuoso, com algumas corredeiras leves e cheio de galhos. A descida estava tranquila até que começo a escutar gritos de "Socorro!", fiquei assustado e meio sem reação. A galera da Papaventura já tinha parado e estava ajudando a tirar o Freddy, que estava preso com o caiaque entre os galhos. Meio desesperado não consegui parar nem desviar e entrei batendo neles todos e socando nos galhos por dentro do rio. Meu caiaque também ficou preso, mas consegui sair meio sem força e assustado. O Valmir, se mostrando um resgatista de primeira, conseguiu tirar o Freddy e seu caiaque e remo.
Bom, essa cena se repetiu pelo menos mais umas quatro vezes comigo e se não estivesse com o Papaventuras e a Tendência Outdoor tinha passado por maus bocados naquele rio. Como disse Rose, "Pedro você conheceu o rio por baixo!" Um pouco mais a frente cruzamos com um caiaque e tinha dois em cima remando e dois dentro do rio sendo puxados. Perguntei o que tinha ocorrido e falaram que tinham "naufragado" seu caiaque. Fiquei bem preocupado, pois era de noite estava frio. Ficar dentro daquele rio gelado poderia ser um risco de hipotermia. Quando entregamos o remo já estavam providenciando o resgate deles.
Chegamos num trecho que teríamos que cruzar o rio, porém a ponte (uma pinguela) tinha apenas os quatro cabos de aço, dois em cima e dois em baixo, onde eram para estar fixadas tábuas. Todas tinham caídas com apenas uns quatro pedaços de paus distribuídos que mais lembravam uma boca banguela. A dúvida era atravessar o rio e ficar com frio por um bom trecho ou arriscar atravessar pelos cabos de aço e correr o risco de cair de uma altura de 8 metros num rio, provavelmente, raso. O Valmir nem pensou duas vezes e seguiu pelos cabos de aço, as duas mãos segurando nos de cima e os pés correndo nos de baixo. Dava agonia só de ver, mas ele passou ileso. Pensei, fudeu vou ter que ir também! Tremendo igual uma vara verde, evitando olhar para baixo e tentando respirar no mesmo compasso que meus pés corriam pelo cabo, consegui atravessar também. A adrenalina foi tanta que deu uma injetada de animo para continuar!
A prova já rumava para seu final. Tínhamos um trecho de Mountain Bike de 6 km. Vínhamos andando num ritmo forte, conversando, dando risada e contando histórias. Nessa hora você conhece o espírito gregário que se desenvolve entre as pessoas numa corrida de aventura. Ajuda que Valmir deu para Freddy, o acordo de cavalheiros de seguirmos juntos, as várias histórias contadas e papos sobre o sentido da vida. A natureza inspira uma certa fascinação que não vem separada do medo. O medo sempre ajuda na integração. De uma forma ou de outra, nestas situações, aprendemos a ajudar o outro e esquecer o espírito competitivo de lado, coisa rara nos esportes de alto rendimento.
Às 2:30 da manhã terminamos a prova, com 17 horas. Descobri que quase todas as equipes tiveram problemas para encontrar o PC4, inclusive algumas muito experientes. Fiquei em segundo lugar na categoria, o Marcelo Santos (líder do ranking solo) faturou e o Ezio fechou o pódio. Apenas os três primeiros de cada categoria conseguiram fazer o circuito completo, a prova foi realmente desafiante. Nada mal para a primeira prova do ano.
Bom, tenho que agradecer a organização da Brou que mais uma vez fez uma prova brutal, com navegação muito exigente e passando por cenários dignos de provas gringas. Queria agradecer ao meu treinador Carlos Eugenio pelo incentivo, a Uff esporte por ter acreditado nos meus planos e me conceder a bolsa atleta este ano, ao Maiko (Borba) que me levou na prova e ainda fez um apoio perfeito e a todos meus amigos que me apoiam.
Acho que, às vezes, fazemos estas loucuras para nós mesmo e para mostrar que nesse mundo, onde todo mundo faz tudo igual, podemos fazer diferente. Corrida de aventura é um desses esportes em que possível trabalharmos, além das qualidades atléticas, as do nosso espírito!
Pedro Alex
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