Que difícil tarefa essa de descrever o que foi para mim fazer essa prova com o Grupo Terra. Tenho acompanhado o trajeto do grupo há mais de 1 ano e sempre muito próxima ajudo a Isa e o Ricardo, fundadores do grupo, na tarefa de organizar os passeios e na divulgação de uma visão positiva da cegueira, mas acredito que nenhuma das minhas experiências com os deficientes visuais comparou-se a esse final de semana.
Desde a saída já foi maravilhoso. Cris e o Edu, dois dos nossos integrantes me esperavam animados na catraca do metrô Clínicas onde tínhamos combinado. Cheguei com a Lu, minha fiel escudeira aqui na empresa e nossa carona para o ponto em que o ônibus do Camp iria nos apanhar.
Saímos de “Sampa” por volta das 3 da tarde, eu e meus dois Guarda Costas, dois caras muito legais. Edu, um veterano nessa tarefa de procurar loucuras para fazer, deficiente visual de baixa visão, trabalha na Natura e está em todas, ama a aventura. O Cris é um judoca de 1,72m , forte como conheço poucos, também baixa visão e de uma educação e delicadeza que lhe fazem ainda mais admirável. Ele trabalha em uma cooperativa de deficientes visuais como avaliador olfativo. Eu, Monica, meio administradora , meio jornalista, funcionária da AlphaVille Urbanismo, mais especificamente da Fundação AlphaVille, atleta de aventura de carteirinha, treinada pela Sueli da Antílope e pela Cris de Carvalho, poderosas... mulheres que admiro demais.
A Isa, quarta integrante da nossa equipe, fundadora do Grupo Terra, publicitária, instrutora da OBB (Outward Bound Brasil), e uma veterana das atividades outdoor, não foi conosco no ônibus, porque teve que trabalhar até as 20:00h e chegaria no dia seguinte por volta das 10 da manhã.
Chegamos em Floripa às 2:40 da madrugada e tínhamos que montar a barraca. O Camping em que ficaríamos estava todo dormindo e como tínhamos pouca luz para montar as barracas, apelei para os meus guarda costas. Precisávamos quase que tatear as barracas para poder encontrar os encaixes das varetas, tarefa meio complicada para mim, mas bastante tranqüila para os meninos. Eles me ajudaram na montagem e em cerca de 40 minutos estávamos com nossos dois alojamentos prontinhos para aquele soninho, já que teríamos que acordar cerca de 4 horas depois. Demos uma assessoria para duas amigas que também montavam a barraca e fomos dormir.
Clínica
Fizemos a clínica do Camp porque o Cris nunca tinha participado de uma corrida de aventura. Sempre sob os olhos atentos do pessoal da organização que mimam a gente muito.... Como dizem os próprios meninos .
Orientação - O pessoal se desdobrou e na lógica de compreender as diferenças e de buscar a melhor forma de aprendizado de cada um, Nora (uma revelação em doçura e paciência para mim), excelente navegadora, instrutora da nossa clínica junto com Roger (Catalão, nosso amigo antigo, sempre buscando as melhores formas de mostrar em mais dimensões os mapas chapados no papel), nos mostraram o que eram curvas de nível nos modelos de isopor, que ajudam muito para a compreensão do mapa, já que podem ser tocados. O Cris relembrou as aulas de geografia e foi super legal. Eles ajudaram nas contas, que na verdade não são meu forte.
Mountain Bike - Excelentes explicações nos deram uma boa noção da bicicleta, um passo que ainda estamos adequando para vencer os trechos das próximas provas em cima de uma tandem (bike de dois lugares). O Edu teve uma experiência muito boa na última prova do Ecomotion e mostrou que dá para completar percursos com esse recurso. Vamos com força.
Nas hora do almoço a Isa chegou e nossa equipe agora estava completa...
Vertical - Sempre uma delícia, os meninos se desdobraram nas explicações e pegaram o Cris, que estava debutando na modalidade. Fomos bem, sempre sob o foco atento do Marcelo e do pessoal da filmagem.
Diogo, Monica, Gilmar, e todos os instrutores foram maravilhosos conosco. Obrigada pelo carinho, pelo cuidado.
SURPRESA! - Logo depois da vertical, encontramos o Zolino, organizador da prova e uma das pessoas que mais vem apoiando esse nosso ingresso no mundo da aventura. Ele é sempre muito empenhado buscando maneiras de incluir cada vez mais os deficientes visuais em todos os processos da corrida, batalhando bússola em braile, entre outras coisas e dessa vez ele caprichou na surpresa.
Às 15:30 chega ele com o road book, todinho em braile, entrega para os meninos e diz: agora vocês passam para as meninas o roteiro da prova e os UTMs e elas plotam o mapa. Tá na mão de vocês!
Foi um susto, eles amaram, ficaram super emocionados. Zola, valeu muito o empenho e o cuidado.
Remo, água e adrenalina - Essa clínica foi também especial. Essa é uma das modalidades prediletas do Edu, que já a fez em várias corridas, e é sempre muito atento, respondendo todas as perguntas do Pedrinho, nosso instrutor. Cris tocou todo o duck, pegou o remo e procurou a melhor forma de compreender as explicações. Aliás foi muito bem sucedido nesta tarefa, com o auxílio do Pedro.
Remamos na represa e conseguimos um ótimo resultado. Eu e o Cris nos entendemos até muito bem. Ele controlou a sua força, que é grande demais para que eu possa fazer o leme sem desgaste, e chegamos rapidinho ao lado oposto. Excelente.
Isa e Edu, mandaram bem também. Um dia delicioso, cheio de novas informações e diversão.
Briefing e Mapa
Fomos para o Costão do Santinho, onde teríamos o briefing da corrida do dia seguinte. Decidimos que desta vez, diferente das outras participações do Terra na corrida de aventura, não pediríamos apoio, já que tínhamos quatro atletas com perfil de aventura e que estavam afim de fazer a prova como um todo. A gente não queria ser café-com-leite...
Recebemos o mapa e fomos para a plotagem. Edu e Cris liam no race book em braile e eu e a Isa plotávamos o mapa. Fechamos as localizações dos PCs. Foi uma experiência única, porque essa hora era sempre muito dos videntes, já que o mapa é mais visual, e desta vez eles ditaram a rota e nos deram as indicações.
Mais uma vez o Zolino acreditou no nosso objetivo de enfocar cada vez mais as potencialidades e respeitar as diferenças fazendo com que todos participassem desta etapa de definição de estratégia e indicação de caminhos. Valeu!
Depois dessa parte definimos nossa estratégia. Concluímos que faríamos até o PC3, que era o trekking, junto com as outras equipes e a partir daí faríamos outros caminhos, porque não tínhamos bicicleta para o PC 4 e 5. Sendo assim iríamos do PC3 para o PC8, depois PC9, que era de vertical, depois direto para o PC6, onde atravessaríamos de barco para o PC10 e seguiríamos para a chegada. Fomos alertados pelo Zolino que teria muita navegação e que os trechos até o PC8 eram bastante íngremes e cheios de escaladas. TOPAMOS....
Fomos para o camping , arrumamos o nosso lanche, montamos nossas mochilas e fomos dormir, ADRENADOS....
A Corrida - Acordamos cedíssimo, nos preparamos , tomamos café junto com o pessoal do STAFF, que montaram até um lanchinho com frutas para levarmos para a trilha... aliás santo lanchinho hein Robson..
Chegando ao local da largada, enchemos os camelbacks de Gatorade e fomos para junto da galera, aquecer e alongar.
Dançamos ao som do nosso querido Douglas, que também acompanha a nossa trajetória, fazendo o som dos passeios do Terra com o maior carinho e incentivando o grupo nessas corridas.
CONTAGEM REGRESSIVA... e .... LARGAMOS...
Saímos pelo caminho da estrada, já que achamos que a costeira não era uma boa opção, seguimos pelas trilhas, cruzamos bosques, pequenas matas, entramos em um trecho de areia e chegamos ao pé de uma duna enorme, no topo o PC1... O Cris quando soube que não havia obstáculo até o PC1, disparou na frente e me rebocou até lá em cima, já que eu e ele formávamos uma dupla. Isa e Edu logo atrás, chegaram rapidinho.
Seguimos navegando no nosso mapa, em direção à praia, onde ficava a estrada até o PC2, que era uma ponte. Tiramos o azimute, várias vezes, com medo de ficarmos perdidos. Seguimos para a praia, e corremos na areia cerca de 30 minutos...
Esse foi um momento muito especial porque os deficientes visuais sempre nos disseram que correr na praia é muito gostoso para eles, porque a sensação de liberdade é total. Eles podem seguir sem medo de obstáculos e sentir o vento no rosto, o barulho do mar...
Os gritos de UHUUUUUUUU do Cris e do Edu nos emocionaram... Foi demais...Obrigada Ilha , Obrigada vento, Obrigada organização por essa escolha... Mas chega de emoção porque esse era só o caminho para o PC2.
Entramos na estradinha que achávamos que era a certa, mas não era, nos perdemos um pouquinho, mas logo achamos outros perdidos e encontramos o cainho certo. Passamos o PC2 e seguimos para o 3, onde as equipes pegavam as bikes, e nós buscaríamos outros caminhos. Chegamos em 17º ficamos super felizes, porque muitas equipes ainda não tinham alcançado esse PC .
Seguimos para a área de vertical, PC8, agora sim foi perrengue. Isa e eu narrando o caminho para que os meninos não tropeçassem ou se machucassem com galhos e troncos no chão, mas era inevitável que eles achassem esses trechos de trekking acidentado bastante complicados.
O perrengue foi total com subidas, escaladas, força, com a Isa na frente, depois o Edu e o Cris e eu fechando a equipe. Foi um trecho bem puxado para nós pela dificuldade do trajeto, mas chegamos ao PC8 e na vertical, linda, linda, linda...
A pedra lá em cima, a vista maravilhosa da lagoa da Conceição, nossa próxima parada parecia tão distante. O Edu se pendurou primeiro e desceu como um azougue, não deu tempo nem da gente dizer que íamos descer juntos... ele descia e gritava UHUUUUU.....
O Cris pela primeira vez na situação estava nervoso, mas feliz. Foi colocado na posição, seguido por mim, e depois pela Isa... Fomos descendo aquela pedra enorme de 30 metros, no meio de um morro, e sentindo aquele vento bater e dar a dimensão da vastidão de nada que havia entre nosso corpo e o chão... O Cris, concentrado, dizia que o vento estava forte e fazia um barulho engraçado... ele disse que dava para sentir que estava muuuitoooo alto...
Descemos ... E adoramos... foi uma experiência linda... O Cris disse que quer de novo ... e a gente sempre quer...
Bom, agora é pernas para que te quero... porque tínhamos um longo trajeto até o PC 6... Fomos nessa, descendo e subindo terrenos muito acidentados... tropeçando, equilibrando, agarrando, tateando... Seguimos em frente... O calor castigava, a água estava acabando e a comida, essa a gente quase nem lembrava, apesar da Isa, avisar de hora em hora que tínhamos que comer, mesmo sem fome... Coisa de mãe sabe...
As dificuldades nos deixavam mais sensíveis e a navegação era complicada, porque as trilhas ficavam às vezes bastante estreitas. O dedo do Cris, que tinha uma inflamação na unha, começa a incomodar, e os trechos a ficar cada vez mais complicados... Mas continuamos... Guerreiros...
Chegamos ao PC9, mas nem fomos até ele, porque nosso objetivo era o PC6, seguimos por trilhas estranhas, no meio de casas maravilhosas... Em uma delas encontramos dois rapazes que nos deram informações sobre como chegar até o barco para a travessia que nos levaria ao PC7, que também era o 10 e de onde iríamos até o PC 11 e à chegada .Enchemos nossos reservatórios de água e seguimos. Pensamos em ir ao PC9 e pegar dois ducks, mas não sabíamos se isso seria possível, então continuamos andando.
Na metade do caminho encontramos a Nora, que disse que poderíamos pegar o barco dali mesmo, e achamos que seria uma boa. Ela chamou o barco e seguimos pela linda Lagoa da Conceição até o PC 7 e 10. Já estávamos com 9 horas de prova, e os trechos de caminhada foram bem difíceis. No PC 10, fomos super festejados pelo pessoal...
Seguimos andando para o PC11 em um caminho agora muito melhor, sem pedras, só chão batido... Fomos caminhando e felizes pensando que tínhamos feito uma prova muito legal, da melhor forma para a qual estávamos preparados naquele momento. Fomos conversando sobre o que poderíamos melhorar e treinar para fazer na próxima, quatro atletas amadores em busca de superação, satisfeitos com suas performances até ali e em busca de melhores resultados sempre... conscientes de nossas limitações e pacientes com elas.
Prometemos, eu e a Isa, fazer um curso de navegação e treinar para não nos perdermos, nem termos tantas dúvidas de trajeto. Planejamos uma forma de conseguir duas tandens e treinar para fazer a parte de bike completa na próxima, combinamos treinos de duck para ficarmos bons de remo... Uma equipe avaliando suas potencialidades e suas limitações, já que demoramos mais nos trajetos de trekking temos que ser poderosos no duck e na bike...
Chegamos ao Camping, ouvimos aquela voz familiar que nos é tão cara do Douglas, gritando: "E agora com vocês chegando, o GRUPO TERRA!!!!"
Foi uma emoção enorme... depois de um dia super puxado, cansativo, embaixo de um sol super forte, chegamos brindados pela chuva, que nos deu de presente seu frescor...
Choramos de alegria , pela nossa superação e consciente que tínhamos dado o nosso melhor...
Valeu CRIS, Valeu EDU, Valeu ISA, Valeu Adventure Camp, Instrutores, Staff, Maisa, Betão, Fejão, Ale, Chubi, Nora, Roger, Zolino, Gilmar, Diogo, Monicas, Pedrinho, e toda a galera que deu uma mega força para todos nos...
Vocês são demais e FAZEM MUITO A DIFERENÇA PARA MIM ....
n.e: Para obter mais informações sobre o Grupo Terra, mande um email para grupoterra@marlin.com.br
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