No final de 2014 foi anunciado que a equipe Columbia Vidaraid alcançou o primeiro lugar no Ranking Mundial de Corrida de Aventura depois de bons resultados no AR World Series e AR World Championship, respectivamente o circuito e campeonato mundiais de corrida de aventura. A equipe compete sob bandeira espanhola, mas tem entre seus integrantes 2 brasileiros, sendo um deles a brasiliense Barbara Bomfim.
Originalmente integrante da equipe Oskalunga, Barbara começou cedo no esporte. Aos 18 anos encarou sua primeira corrida de aventura e nunca mais parou. Desde então, vem acumulando prêmios, pódios e causos pelo Brasil e pelo mundo.
Conheça um pouco mais a atleta que praticamente cresceu junto com as corridas de aventura no Brasil, ultrapassou fronteiras e chegou no topo do mundo.
Adventuremag - Como conheceu as corridas de aventura?
Barbara Bomfim - Conheci as corridas de Aventura no ano de 2000 por meio do Monclair, meu ex-companheiro de equipe na Oskalunga. Estava estudando na biblioteca da Universidade de Brasilia e nos cruzamos. Como eu tinha meu capacete de bicicleta em cima da mesa enquanto estudava, ele se aproximou e comentou que haveria uma competição em Pirenopolis - cidade perto de Brasilia - em que equipes de três pessoas teriam que pedalar, fazer trekking e andar a cavalo, por diversas horas. Eu achei o máximo e fiquei super interessada, mas era muito iniciante no mountain bike e sentia que não conseguiria encarar o desafio, então indiquei uma amiga, a Julyana Machado, que estaria melhor preparada para encarar esses vários quilômetros de mountain bike.
Porém acabei me juntando com outros dois amigos, o Ciro e o Adolfinho, e nos jogamos também nessa roubada. E que roubada! Ficamos perdidos por várias horas juntamente com a Oskalunga (Guilherme, Monclair e Juliana) e a equipe do Lico (Lico, Lufe e Tatiana). Curtimos um montão o mato e terminamos empatados em terceiro, quarto e quinto lugar. Foi inesquecivel! E foi dai que tudo começou...
Qual sua base esportiva antes das corridas de aventura?
Sempre pratiquei esportes, mas competitivamente só a partir de 2001 (a prova de 2000 foi mais uma expedição que uma competição em si). Antes nadava, fazia capoeira, musculação e já dava minhas pedaladas amadoras por Brasilia. Comecei a correr em 98 quando fiz intercâmbio nos EUA e fazia parte da equipe de futebol feminino da escola. Foi uma combinação de vários esportes, por isso as provas multiesportivas me interessam mais que apenas uma só modalidade.
Como surgiu o convite para integrar a Oskalunga? E como foram as primeiras provas?
O Monclair sempre me mostrava seu projeto para participar do Circuito Brasileiro de Corridas de Aventura com Oskalunga e eu achava o máximo! Acabei indo com ele e o Guilherme para a nossa primeira prova em Santa Rita do Passa Quatro, organizada pelo Zolino. Nós eramos totalmente inexperientes, sem dinheiro, mas com muita vontade! Ligamos para a organização dias antes para perguntar se a equipe de apoio necessitava ter um carro!!!!! Eles ficaram um pouco chocados com nossa pergunta - por quê será? =)
E assim tivemos que agilizar um carro, que nenhum de nós tinhamos. O Monclair teve então a brilhante ideia de ligar para sua ex-namorada na época, Patricia - hoje sua esposa - para pedir o carro emprestado e também para convidá-la a fazer nosso apoio. A Pati emprestou o Chevete Hatch com freio defeituoso para a equipe e "despencou" da Bahia de ônibus para fazer nosso apoio. Foi uma aventura total! Nós não tinhamos equipamento apropriado. O Monclair competiu de abada de capoeira e eu de calça de fazer ginastica. Nossas mochilas eram aquelas de escola, da Company. O casaco era um moleton dentro de um saco de supermercado - para vedar da chuva, claro! Mas nós tinhamos muita vontade e estávamos super determinados! Completamos a prova na sétima colocação!! Foi super motivante e o Guilherme chegou à conclusão que poderiamos, sim, ser os melhores do Brasil! Um gênio esse rapaz...
Daí em diante concluimos que realmente tínhamos que seguir em frente. O problema seria que as seguintes provas seriam com 4 pessoas na equipe e necessitávamos de outro integrante. Convidamos o Yuri, um ex-colega do curso de Engenharia Florestal que pedalava bastante. Fomos com ele para a prova do Litoral de SP. E convidamos o Lico para fazer nosso apoio - porque ele tinha carro e experiência suficiente! Lembrando que nenhum de nós tinha carro... E o Lico aceitou já de olho na possibilidade de entrar para a equipe.
Terminamos a corrida com corte, pois foi uma prova bem mais longa e dificil que a de Santa Rita, mas felizes da vida, novamente. A experiência com o Yuri não foi a melhor de todas, então decidimos convidar o Lico. E claro que ele aceitou! Assim a equipe Oskalunga, que durou por tantos anos, foi formada!
A primeira prova com o Lico foi em Campos do Jordão. Ele tinha acabado de fazer o IronMan e estava certo que tiraria de letra... Bem, ele sofreu um pouco - por exemplo fazendo um rapel na madrugada com 5 ºC, vomitando de medo - mas foi o parceiro perfeito que faltava em nossa equipe. Terminamos na sexta colocação e ficamos ainda mais motivados, pois estávamos melhorando nossa posição no Circuito Brasileiro de Corrida de Aventura.
No ano seguinte, em 2002, o Monclair conseguiu aprovar um projeto de patrocinio com a Brasil Telecom, empresa que havia acabado de comprar a antiga TeleBrasilia e tinha como responsabilidade social investir no esporte, principalmente localmente. Foi nosso pulo para melhorar e competir bastante, até atingir o topo do Ranking Brasileiro! Então viajamos para o Rio Grande do Sul para participar de duas provas do Circuito Brasileiro de 2002 - o Circuito das Hortênsias - de Gol!!! Foram 3 dias de carro, inesqueciveis. A gente ia parando e comprando banana no meio do caminho, farofada total. Chegamos às 18h e a largada seria às 8h do dia seguinte, após 3 dias inteiros viajando.
Sofremos bastante com o calor, mas conseguimos uma quarta colocação! E cada vez nos motivavamos mais! Passamos a semana acampados num parque no meio da cidade, secando a roupa no rack de bikes do Golzinho e dando um alô para quem passava caminhando e ficava chocado ao ver aquelas pessoas ali. Foram dias treinando para a prova do fim de semana seguinte, quando conseguimos conquistar a terceira colocação! WOW!!! A viagem de volta foi eterna... e o Gol vermelho do Lico - o Diabolin - nunca mais foi o mesmo. Mas se não fosse esse Golzinho não teríamos conquistado essa colocação inédita para 4 atletas de Brasilia sem lenço e sem documento, competindo contra atletas fortissimos de SP com ótimas condições financeiras.
Vocês viajavam sempre com o carro lotado, carregando tudo - inclusive bicicletas - para 4 pessoas!
Foram várias as viagens de Gol, pois depois do Diabolin do Lico, foi a vez do Gol preto do Guilherme e depois com o branco, do avô Geraldo - vô do Lico. Tinha tanta coisa dentro do Gol que os passageiros de trás não conseguiam se ver, já que havia uma parede de malas entre as duas pessoas. E quando o Luiz (fotografo) viajava junto então, nem se fala. Na sequência eu ganhei do meu pai um Fiat Strada, que também foi muito usado pela equipe. Dai nós já estávamos super chiques, pois viajávamos com dois carros! Na época não havia promoções de passagens aéreas como hoje e as viagens tinha que ser de carro mesmo. Até porque tinha que ir com equipe de apoio e etc.
Numa dessas viagens, no caso com nosso amigo e grande atleta Paulo Guimarães, o pneu do Gol furou e paramos para trocar. Nisso o macaco quebrou e o carro caiu!!! Sorte que o Lico sempre pensava nessas coisas e tinha colocado uma roda embaixo do carro, senão estariamos parados na estrada até hoje...
Também muitas vezes parávamos na madrugada para buscar hotel e era dificil achar algo decente, então já dormimos em cada espelunca com cheiro de leite de rosas... Mil estórias inesqueciveis!
Mas depois vocês acabaram ganhando 2 carros...
Sim, a Oskalunga ganhou várias edições do Circuito Adventure Camp, organizado pelo Zolino. Foram várias provas em locais muito bonitos de SP, RJ e até Florianópolis. Tivemos o privilegio de ganhar carros como premiação, que foi excelente para a equipe na época. O primeiro carro vendemos e compramos uma L200 usada, que nos trouxe a infelicidade de quebrar mais do que andar... O outro foi vendido e a equipe dividiu a premiação.
Alguma corrida marcante?
Foram várias corridas muito marcantes, umas muito boas e competitivas, outras onde tudo deu errado... Mas o Ecomotion 2003 para mim foi muito marcante, não só pela beleza do lugar, mas por ter sido a primeira prova de expedição em que conseguimos uma boa colocação - 3º lugar e segunda equipe brasileira.
Depois, acho que o Mundial no Brasil em 2008, onde conseguimos o 4º lugar e melhor colocação brasileira na estória de todos os mundiais (de uma equipe 100% brasileira). Acho que a Oskalunga foi uma equipe muito sólida com muitos excelentes resultados, com muita irreverência, força, companheirismo e paixão pelo esporte e pela natureza!
No Ecomotion Pro 2009 ao ínvés de correr você ficou na equipe de apoio. Como foi essa experiência em estar no outro lado?
Estava muito ocupada finalizando minha graduação em Engenharia Florestal, portanto não tive tempo para treinar o suficiente para participar da corrida. Já havia feito apoio da equipe Oskalunga no Ecomotion de 2005, nas Serras Gaúchas, e fazer isso é uma obra de caridade. Poucos atletas realmente sabem o que o apoio faz e não valorizam essa presença praticamente divina a cada área de transição. Eu aprendi muito fazendo apoio nessas duas edições do Ecomotion e digo que é muito mais fácil e gratificante competir. Claro que estar no apoio é ainda melhor do que ficar em casa, pois a interação entre as equipes de apoio é bem legal.
Chegou a participar em outras equipes?
Sempre competi com a Oskalunga antes de competir com a Vidaraid. As exceções foram o Ecomotion 2004 com a equipe Playboy (Bia, Jorge, Eu e Dri) e a Buff Thermocool (Arnau, Ville, Iukka e Eu). A experiência com a equipe de maioria feminina foi incrivel e ainda quero repetir! Correr com a Buff também foi um aprendizado enorme, ainda mais com os atletas incriveis que estavam nessa formação. Aprendi bastante mesmo com eles. Mas ter a própria equipe sempre foi fundamental para mim e acho que a cada prova os atletas conseguem se entrosar mais. Assim creio que mudar os integrantes demais acaba prejudicando o entrosamento e o progresso da equipe.
Como surgiu o convite para a Columbia Vidaraid?
Em 2011 eu e o Lico competimos com o Diogo Malagon e o Rafael Melges durante o ano, participando de provas como o Adventure Camp e a Terra de Gigantes, além do Ecomotion, que ganhamos pela primeira vez. Foi uma prova surpreendente, pois saímos do fundão até o primeiro lugar, que não imaginavamos conquistar diante das dificuldades que passamos durante a prova. Assim, conseguimos a vaga para o Mundial na Tasmânia.
Infelizmente a equipe se desfez no final do ano (na verdade, eu saí da equipe) e recebi o convite para competir com a Vidaraid, contra quem eu competi no AR World Series na Costa Rica, onde fui com a equipe Buff Thermacool. Eu seria a segunda atleta da equipe espanhola, que competia com a Uxue Fraile, hoje grande nome do Ultra Running mundial.
Nos organizamos assim para competir o Ecomotion 2012 na Chapada dos Veadeiros e conquistamos o primeiro lugar, então vi a possibilidade de seguir competindo na equipe que era - e ainda é - uma equipe com enorme potencial.
Você vive do esporte?
Nao vivo do esporte. Na época da Oskalunga Brasil Telecom recebiamos salário e vivia sim do esporte. Porém, sempre estudei e durante os anos de competição cursava Engenharia Florestal na Universidade de Brasilia. Hoje estou em um doutorado pleno na University of California Davis na área de Solos e Biogeoquimica. Sou financiada pela CAPES e as competições em Corridas de Aventura são um hobby de luxo. Claro que me dedico aos treinos, mas o esporte não é minha prioridade.
Como divide a vida esportiva e a pessoal/profissional?
Treino várias sessões por semana, entre mountain bike, trail running, kayaking e ciclismo. Como já venho treinando desde 2001, tenho uma base boa. Treino muito menos do que deveria, mas não tenho tempo e nem quero me dedicar horas demais ao esporte. Tenho que estudar bastante e também quero aproveitar a vida.
Quantos paises já conheceu com as corridas de aventura?
Já competi na Argentina, Chile, Uruguai, Costa Rica, Equador, Estados Unidos, França, Espanha, Portugal, Nova Zelândia, Austrália, Árica do Sul, Escócia, Pais de Gales, Hungria e em quase todos os Estados do Brasil!
Qual foi a primeira prova internacional?
Minha primeira prova internacional foi na África do Sul, em 2002, com Oskalunga. O Alexandre Freitas nos presenteou com uma vaga na Adventure Quest África, pois sempre acreditou que teriamos potencial de melhorar e ser uma grande equipe. Fomos muito cansados por ter competido no Mini Ema menos de uma semana antes, assim acabei desistindo da prova, infelizmente. Foi um grande aprendizado: nunca mais desisti de prova nenhuma!!! A África do Sul também nos chamou muito a atenção por sua beleza exótica!
Desde o início você sempre esteve entre as melhores equipes, seja no Brasil ou no mundo. Qual o segredo para se manter no topo?
Foram muitos quilômetros rodados em competições e treinos para conseguir bons resultados. Ainda não consigo explicar direito como, mas sei que posso sempre conseguir uma boa colocação em Corridas de Aventura. Hoje prefiro as provas longas, de 5 a 7 dias, pois meu corpo funciona melhor em um ritmo mais baixo e estável. Adoro desafios, assim acho que provas técnicas também são mais convidativas.
Acredito que o entrosamento da equipe é fundamental. Não consegui nenhum dos meus resultados sozinha, mas sim com minha equipe. Tento sempre incentivar um bom trabalho em equipe e frizar que uma boa estratégia e um planejamento impecável são peças-chaves para um bom resultado. Temos conseguido competir com equipes compostas por atletas infinitamente mais fortes que nós da Vidaraid, mas como equipe funcionamos muito bem. Assim, a dica é o trabalho em equipe e pensar em todos os micro-detalhes que no final fazem muita diferença!
Como é estar no topo do ranking mundial depois dessa trajetória?
É muito bom saber que consegui chegar com minha equipe no topo do ranking mundial. Se alguém me dissesse isso em 2001, quando estava competindo nas minhas primeiras provas de aventura, eu iria dar risada e dizer: impossivel! Hoje vejo que sim é possivel, só que a parte financeira é muito limitante nesse esporte. Digo claramente que uma equipe com mais recursos consegue subir no ranking mundial com muito mais facilidade. No nosso caso, escolhemos bem as provas que participamos e sempre vamos despreocupados das outras equipes... fazemos nossa prova e isso tem dado muito certo!! Ser primeira do ranking significa que nada é impossivel, basta trabalhar bastante e pensar mais ainda!
Percebe muita diferença entre as provas atuais e as antigas?
Não tenho competido no Brasil faz tempo, com exceção do Ecomotion Pro, assim não posso fazer uma comparação sobre o progresso das provas brasileiras... Em relação ao Ecomotion, vi a evolução da corrida ao longo dos anos e digo com certeza que essa prova possui nivel técnico tão ou mais elevado que maior parte das etapas integrantes do AR World Series.
Internacionalmente, vejo que elas estão ficando cada vez mais técnicas e interessantes! Hoje uma orientação muito boa é fundamental e as provas sem apoio tambem vieram para ficar, o que é a melhor solução para ter muitas equipes internacionais numa prova.
A preocupação é que o nivel da maioria das equipes ainda é muito baixo em relação à orientação e para as provas continuarem progredindo do jeito que eu, por exemplo, gostaria, teriamos cada vez menos equipes fazendo a prova completa, tendo assim que ser cortadas no meio do percurso. Isso não seria uma boa alternativa para o esporte. Vejo talvez uma solução como a do triathlon, com categorias Pro e Amadora, assim o organizador poderia colocar PCs extras para a Pro, por exemplo, e ter a categoria Amadora fazendo um percurso um pouco menor e menos técnico em relacao à orientação.
Como é o apoio da sua familia? Sabemos que é dificil explicar o que é uma corrida de aventura para o público em geral. Seus pais sabem e entendem o que você faz e os perrengues que passa?
Minha familia me apoia e torce bastante! Eles sempre sofreram com a preocupação, pela possibilidade de eu me machucar nas provas e etc... Mas acho que hoje se orgulham de ter uma filha que se dedica ao esporte e não à balada. Também acho que eles valorizam a saúde e sabem que sou uma pessoa muito mais saudavel em geral. O esporte também me proporciona conhecer lugares maravilhosos e acho que eles curtem as fotos dos lugares que tenho visitado e competido também. Meus pais entendem sim a competição, porém nunca acompanharam de perto para ver o que realmente passamos. Eles acham uma loucura! E em certo ponto eles estão certos, né?!
O que significa as corridas de aventura para sua vida?
Para mim, hoje a corrida de Aventura é um estilo de vida. Gosto de praticar esportes outdoor e praticaria independentemente de ter competições em vista. Também amo viajar, então a corrida de aventura combina tudo isso: esporte + viagens. Também fiz amigos ao longo dos anos competindo e fico feliz em reencontrá-los a cada competição. Adoro conhecer pessoas de outros paises e por meio das corridas tenho conhecido pessoas incriveis!
Qual a programação do seu calendário 2015?
Viajo em fevereiro com a Vidaraid para competir na GODZone na Nova Zelândia - 23 de fevereiro a 7 de março - e em seguida queremos ir à China, no final de abril. Logo depois tenho que ir a Amazônia fazer meu trabalho de campo. Mas com certeza estaremos no Mundial no Pantanal, que será a prova do ano para nossa equipe! Imagina ganhar um mundial no Brasil - inacreditavel!
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